sábado, 6 de outubro de 2012

...Concelho - Centralidade da Mealhada boa (até) para a prostituição?...



Ao passar pelas estradas – Nacional 1 e Nacional 234 – do concelho da Mealhada repara-se que, nas últimas semanas, o número de prostitutas aumentou significativamente. O facto torna-se ainda mais evidente porque são sobretudo cada vez mais jovens e bonitas as mulheres que recorrem a este tipo de vida. Após alguns alertas da população, a repórter do Jornal da Mealhada foi saber junto das autoridades, de um assistente social, de uma psicóloga da Associação Existências, de Coimbra, e também de uma prostituta de rua, o dia-a-dia destas mulheres e os motivos que as levam a optar por este tipo de vida.
“Temos conhecimento da situação mas sempre existiram mulheres à beira da estrada, apesar de agora haver em maior quantidade. É uma situação que se verifica por todo o distrito de Aveiro”, disse o capitão Paulo Serra, do destacamento da Guarda Nacional Republicana (GNR) de Anadia. “Antigamente, viam-se menos e eram todas portuguesas. De há um ano para cá, aumentou o número de prostitutas e muitas delas são romenas e brasileiras”, explicou José Mota, assistente social na Associação Existências, de Coimbra, que todas as semanas têm técnicos a visitar as prostitutas do concelho da Mealhada.
A repórter do Jornal da Mealhada falou com uma prostituta romena, que disse ter vinte e um anos de idade, e estar em Portugal há sete meses. “Saí da Roménia para ganhar dinheiro, porque tenho uma filha. Fui para Espanha para trabalhar como prostituta. Lá em Espanha disseram-me que aqui, em Portugal, se ganhava melhor”, afirmou. “Contactamos com diversas prostitutas, diariamente, pois fazemos uma cobertura que vai de Pombal até ao Luso. É normal para nós ouvir dizer, por parte das prostitutas, que em Espanha ‘alguém’ as aconselha a vir para a região centro de Portugal”, explicou José Mota. “A prostituição é um problema cada vez mais frequente, que pode dever-se à crise económica em que o país se atravessa. Por outro lado, outra das razões poderá ser o facto de a União Europeia ter sido alargada a mais países. Muitas das jovens que se encontram na região a prostituírem-se são oriundas, por exemplo, da Roménia. Antigamente, era preciso o passaporte carimbado e com os vistos, para se poder estar em outro país, agora o acesso é livre”, acrescentou o capitão Paulo Serra.
Acerca da legalidade da actividade o capitão Paulo Serra disse: “As mulheres estarem à beira da estrada não é crime, o único problema que pode existir, mas isso é muito difícil de provar, é se existir alguém que coloque uma mulher em determinado sítio e que com o serviço por ela desempenhado, esteja a ganhar dinheiro”. “ Vivo sozinha e trabalho por conta própria. Estou aqui todos os dias exceptuando ao domingo, que optei por não trabalhar”, explicou a prostituta romena. O capitão da GNR de Anadia acrescentou: “O local onde elas estão é considerado via pública e não existe nenhuma lei que as proíba de estarem lá e vestidas da maneira que quiserem. Não há suporte legal para podermos actuar”.
Sobre o dia-a-dia junto à estrada, a prostituta romena, com quem falámos, explicou: “Este tipo de trabalho é incerto. Há dias em que tenho um ou dois clientes, mas há outros dias em que não faço nada. Por cada pessoa com quem estou ganho vinte euros e mensalmente, faço cerca de mil euros”. José Mota afirmou: “A prostituição é realmente uma micro-economia, onde está patente a lei da oferta e da procura. Muitas das prostitutas levam muito menos que vinte euros e, por isso, há uma grande concorrência entre elas”.
E que condições têm, quando estão a trabalhar junto às estradas? José Mota responde: “Aqui na Mealhada, normalmente, elas trabalham dentro dos carros dos clientes. Algumas têm sítios, no mato, que arranjam com um colchão, à maneira delas, para criar um bom ambiente aos seus clientes”.
O uso do preservativo neste tipo de profissão é a maior preocupação da sociedade, em geral. A prostituta romena afirmou à repórter do Jornal da Mealhada: “Regularmente vou a um médico ginecologista. O preservativo é o meu instrumento de trabalho, nunca o deixo de usar”.
“A Associação Existências trabalha em três projectos, neste momento. O que nos traz à Mealhada é apenas um, o projecto de ‘Adão e Eva’, que nos remete para a prevenção da Sida junto da população prostituída do sexo feminino e com a prostituição homossexual, de rua. Este projecto é patrocinado pelo Ministério da Saúde e, por este motivo, semanalmente, percorremos várias zonas da região centro a dar, gratuitamente, preservativos a esta população. O nosso objectivo é tentar prevenir a propagação do vírus da Sida e de outras doenças sexualmente transmissíveis. Para isso, fomentamos o uso do preservativo”, explicou José Mota. O assistente social ainda expressou a grande preocupação que existe na associação em relação ao uso do preservativo: “Muitas das prostitutas com quem falamos, contam-nos que há homens que pagam o dobro, para terem relações sexuais sem preservativo. Aqui gera-se um problema entre elas. Dizem que mandam esses clientes embora e acusam-se umas outras de serem mentirosas e terem relações sexuais sem preservativo. É-nos difícil saber quem fala a verdade e quem mente”.
A Associação Existências tem também protocolos estabelecidos com alguns Centros de Saúde em Coimbra que dão apoios às prostitutas de rua da região. Questionado se a associação tem algum protocolo estabelecido com alguma instituição da Mealhada, Paulo Anjos, coordenador dos projectos da associação, assegurou: “Tivemos uma reunião com os responsáveis do Centro de Saúde da Mealhada para estabelecermos um protocolo e, brevemente, esse protocolo será colocado em prática. Contudo, as prostitutas que estão a trabalhar no concelho da Mealhada podem usufruir dos serviços das instituições, em Coimbra, com quem temos protocolos”.
Acerca dos laços que se criam com os profissionais desta associação, Ana Martins, psicóloga na Associação Existências, afirmou: “Semanalmente, somos aguardados por estas mulheres com alguma ansiedade. Quando falhamos uma semana, elas reclamam quando voltamos cá”.
Sobre esta profissão e a necessidade ou não que estas mulheres têm para o fazer, José Mota explicou: “Elas têm uma grande preocupação em ganhar dinheiro para sustentar a família. Aqui, na Mealhada, só há um ou dois casos de mulheres que trabalham ‘por gosto’ e só para elas”. Ana Martins acrescentou: “Elas são pessoas ‘normais’, no sentido em que cumprem os seus horários de trabalho como qualquer outra pessoa, mas depois têm uma vida familiar normal. Vão para casa, fazem o jantar, cuidam dos filhos, etc.”. À repórter do Jornal da Mealhada, a prostituta romena concluiu: “Não tenho outra coisa para fazer e também não quero porque gosto daquilo que faço”.
Apesar de todos estes testemunhos, o Jornal da Mealhada conseguiu apurar que, diariamente, uma carrinha romena vem deixar e buscar mulheres romenas para se prostituírem nas estradas do concelho da Mealhada. Para conhecer melhor e mais aprofundadamente, o trabalho que é feito, todas as terças-feiras, pelos técnicos da Associação Existências, nas estradas da Mealhada, o leitor pode consultar o sítio da internet www.existencias.net.                 

Mónica Sofia Lopes

Reportagem publicada na edição impressa do Jornal da Mealhada de 12 de março de 2008...

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