Ao passar pelas estradas – Nacional 1 e Nacional 234 –
do concelho da Mealhada repara-se que, nas últimas
semanas, o número de prostitutas aumentou significativamente. O facto torna-se
ainda mais evidente porque são sobretudo cada vez mais jovens e bonitas as
mulheres que recorrem a este tipo de vida. Após alguns alertas da população, a
repórter do Jornal da Mealhada foi saber junto das autoridades, de um
assistente social, de uma psicóloga da Associação Existências, de Coimbra, e
também de uma prostituta de rua, o dia-a-dia destas mulheres e os motivos que
as levam a optar por este tipo de vida.
“Temos conhecimento da situação mas sempre existiram
mulheres à beira da estrada, apesar de agora haver em maior quantidade. É uma
situação que se verifica por todo o distrito de Aveiro”, disse o capitão Paulo
Serra, do destacamento da Guarda Nacional Republicana (GNR) de Anadia.
“Antigamente, viam-se menos e eram todas portuguesas. De há um ano para cá,
aumentou o número de prostitutas e muitas delas são romenas e brasileiras”,
explicou José Mota, assistente social na Associação Existências, de Coimbra,
que todas as semanas têm técnicos a visitar as prostitutas do concelho da
Mealhada.
A repórter do Jornal da Mealhada falou com uma prostituta
romena, que disse ter vinte e um anos de idade, e estar em Portugal há sete
meses. “Saí da Roménia para ganhar dinheiro, porque tenho uma filha. Fui para
Espanha para trabalhar como prostituta. Lá em Espanha disseram-me que aqui, em
Portugal, se ganhava melhor”, afirmou. “Contactamos com diversas prostitutas,
diariamente, pois fazemos uma cobertura que vai de Pombal até ao Luso. É normal
para nós ouvir dizer, por parte das prostitutas, que em Espanha ‘alguém’ as
aconselha a vir para a região centro de Portugal”, explicou José Mota. “A
prostituição é um problema cada vez mais frequente, que pode dever-se à crise
económica em que o país se atravessa. Por outro lado, outra das razões poderá
ser o facto de a União Europeia ter sido alargada a mais países. Muitas das
jovens que se encontram na região a prostituírem-se são oriundas, por exemplo,
da Roménia. Antigamente, era preciso o passaporte carimbado e com os vistos,
para se poder estar em outro país, agora o acesso é livre”, acrescentou o
capitão Paulo Serra.
Acerca da legalidade da actividade o capitão Paulo Serra
disse: “As mulheres estarem à beira da estrada não é crime, o único problema
que pode existir, mas isso é muito difícil de provar, é se existir alguém que
coloque uma mulher em determinado sítio e que com o serviço por ela
desempenhado, esteja a ganhar dinheiro”. “ Vivo sozinha e trabalho por conta
própria. Estou aqui todos os dias exceptuando ao domingo, que optei por não
trabalhar”, explicou a prostituta romena. O capitão da GNR de Anadia
acrescentou: “O local onde elas estão é considerado via pública e não existe
nenhuma lei que as proíba de estarem lá e vestidas da maneira que quiserem. Não
há suporte legal para podermos actuar”.
Sobre o dia-a-dia junto à estrada, a prostituta romena, com
quem falámos, explicou: “Este tipo de trabalho é incerto. Há dias em que tenho
um ou dois clientes, mas há outros dias em que não faço nada. Por cada pessoa
com quem estou ganho vinte euros e mensalmente, faço cerca de mil euros”. José
Mota afirmou: “A prostituição é realmente uma micro-economia, onde está patente
a lei da oferta e da procura. Muitas das prostitutas levam muito menos que vinte
euros e, por isso, há uma grande concorrência entre elas”.
E que condições têm, quando estão a trabalhar junto às
estradas? José Mota responde: “Aqui na Mealhada, normalmente, elas trabalham
dentro dos carros dos clientes. Algumas têm sítios, no mato, que arranjam com
um colchão, à maneira delas, para criar um bom ambiente aos seus clientes”.
O uso do preservativo neste tipo de profissão é a maior
preocupação da sociedade, em geral. A prostituta romena afirmou à repórter do
Jornal da Mealhada: “Regularmente vou a um médico ginecologista. O preservativo
é o meu instrumento de trabalho, nunca o deixo de usar”.
“A Associação Existências trabalha em três projectos, neste
momento. O que nos traz à Mealhada é apenas um, o projecto de ‘Adão e Eva’, que
nos remete para a prevenção da Sida junto da população prostituída do sexo
feminino e com a prostituição homossexual, de rua. Este projecto é patrocinado
pelo Ministério da Saúde e, por este motivo, semanalmente, percorremos várias
zonas da região centro a dar, gratuitamente, preservativos a esta população. O
nosso objectivo é tentar prevenir a propagação do vírus da Sida e de outras
doenças sexualmente transmissíveis. Para isso, fomentamos o uso do
preservativo”, explicou José Mota. O assistente social ainda expressou a grande
preocupação que existe na associação em relação ao uso do preservativo: “Muitas
das prostitutas com quem falamos, contam-nos que há homens que pagam o dobro,
para terem relações sexuais sem preservativo. Aqui gera-se um problema entre
elas. Dizem que mandam esses clientes embora e acusam-se umas outras de serem
mentirosas e terem relações sexuais sem preservativo. É-nos difícil saber quem
fala a verdade e quem mente”.
A Associação Existências tem também protocolos estabelecidos
com alguns Centros de Saúde em Coimbra que dão apoios às prostitutas de rua da
região. Questionado se a associação tem algum protocolo estabelecido com alguma
instituição da Mealhada, Paulo Anjos, coordenador dos projectos da associação,
assegurou: “Tivemos uma reunião com os responsáveis do Centro de Saúde da
Mealhada para estabelecermos um protocolo e, brevemente, esse protocolo será
colocado em prática. Contudo, as prostitutas que estão a trabalhar no concelho
da Mealhada podem usufruir dos serviços das instituições, em Coimbra, com quem
temos protocolos”.
Acerca dos laços que se criam com os profissionais desta
associação, Ana Martins, psicóloga na Associação Existências, afirmou:
“Semanalmente, somos aguardados por estas mulheres com alguma ansiedade. Quando
falhamos uma semana, elas reclamam quando voltamos cá”.
Sobre esta profissão e a necessidade ou não que estas
mulheres têm para o fazer, José Mota explicou: “Elas têm uma grande preocupação
em ganhar dinheiro para sustentar a família. Aqui, na Mealhada, só há um ou
dois casos de mulheres que trabalham ‘por gosto’ e só para elas”. Ana Martins
acrescentou: “Elas são pessoas ‘normais’, no sentido em que cumprem os seus
horários de trabalho como qualquer outra pessoa, mas depois têm uma vida
familiar normal. Vão para casa, fazem o jantar, cuidam dos filhos, etc.”. À
repórter do Jornal da Mealhada, a prostituta romena concluiu: “Não tenho outra
coisa para fazer e também não quero porque gosto daquilo que faço”.
Apesar de todos estes testemunhos, o Jornal da Mealhada conseguiu
apurar que, diariamente, uma carrinha romena vem deixar e buscar mulheres
romenas para se prostituírem nas estradas do concelho da Mealhada. Para
conhecer melhor e mais aprofundadamente, o trabalho que é feito, todas as
terças-feiras, pelos técnicos da Associação Existências, nas estradas da
Mealhada, o leitor pode consultar o sítio da internet www.existencias.net.
Mónica Sofia Lopes
Reportagem publicada na edição impressa do Jornal da Mealhada de 12 de março de 2008...
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