Sandro Alves “trocou” atuação num
bar na Rue Charonne para ficar em casa
Os ataques terroristas
aconteceram em França, há quase duas semanas, mas depressa se alastraram à Europa,
a todo o mundo…. O sentimento é unânime. Medo, tristeza e impotência por nada
se conseguir fazer. Bem perto dos locais da tragédia reside Sandro Alves,
natural da Mealhada, e que nos habituamos a ver noticiado pelos seus feitos
profissionais que, ao longo da vida, foi conseguindo. Hoje, porém, o trabalho que
o Jornal da Mealhada apresenta é outro… O jovem, de trinta e seis anos,
residente em Paris há muitos anos, conta-nos o que tem vivido e o que sentiu,
por na noite do dia 13 de novembro não estar a “tocar” num bar na Rue Charonne
(a cem metros de um dos locais da tragédia), como costuma fazer todas as
sextas-feiras.
O provérbio tradicional diz que
“há dias de sorte” quando as tragédias não atingem os mais próximos. Talvez
Sandro Alves diga que “há noites de sorte”… “Por acaso, na noite de sexta-feira
13 encontrava-me em
casa. Normalmente às sextas-feiras toco com um grupo de
amigos precisamente num bar na Rue Charonne (a cem metros de um dos locais da
tragédia), mas nessa sexta fiquei em casa”, começou por contar-nos Sandro Alves.
Os momentos após os ataques
“foram de terror, pesadelo, dor, angústia e incerteza”. “Acho que, como para as
outras pessoas, era completamente difícil acreditar no que se estava a passar.
Isto acontece nos filmes, não deveria acontecer assim na realidade numa cidade
destas….”, descreve Sandro Alves, que continua: “No sábado quando acordei
pensei que se tratava de algo saído de um pesadelo. Pouca circulação se via nas
ruas, algo que é completamente anormal, excepto nos locais de foco dos
atentados onde as pessoas demonstravam plena curiosidade de vir aos mesmos após
os atentados e de aí homenagear as vítimas que horas antes tinham perdido as
suas vidas. Em geral, as pessoas estavam e estão cabisbaixas, olhando com
desconfiança à sua volta. Então no metro é a desconfiança total…”.
E com o passar dos dias e dos
acontecimentos, o sentimento atenua-se. “Neste momento tenho a sensação de ver
menos pessoas nas esplanadas e cafés típicos de Paris. Há menos pessoas a
passear e sente-se um clima de insegurança e de tristeza que paira no ar. Há
muito receio de sair. Contudo, há também uma grande onda de solidariedade de
todos os parisienses em relação a esta onda de terror que traumatizou a
cidade”, explica o jovem mealhadense, que enfatiza: “Cada vez que se ouve uma
sirene ou um carro da polícia ou ambulância em stress pensa-se imediatamente
que tudo recomeçou ou que está em vias de recomeçar. Há esse receio!”.
Apesar de fazer “a vida normal”,
Sandro Alves toma as suas precauções: “Tento evitar por exemplo o metro e andar
à superfície, pois no metro há multidões que poderão ser alvo fácil e gerar
onda de pânico”. “No entanto, a segurança está bem reforçada, há militares por
todo o lado, mesmo que saibamos que tudo possa recomeçar do modo mais
inesperado possível. No instituto onde trabalho temos à entrada três ou quatro
militares armados dos pés à cabeça, sendo que quando há mochilas ou sacos, é-se
revistado imediatamente … A nível pessoal quando tenho vontade de ir a algum
lado, vou. Tento não pensar muito se será, ou não, perigoso”, confessa.
Apesar de viver perto do
Bataclan, situado em Oberkampf, e da rue Charonne, situada na Bastille, Sandro
Alves afirma: “As coisas podem acontecer em qualquer lado, pois Paris está
sempre cheia de pessoas nas ruas e o foco principal dos terroristas é o de atingir
sempre o maior número de vítimas possível”.
Sandro Alves, de trinta e seis
anos e que esteve sempre ligado ao Carnaval Luso Brasileiro da Bairrada
enquanto músico, trabalha em França há cerca de uma década, num instituto de
investigação, no qual é responsável científico de projetos de terapia genética
para tratamento de doenças neurodegenerativas. Neste momento, é ainda o
responsável pelo desenvolvimento de toda a parte pré-clínica de um medicamento
para tratamento da doença de Alzheimer (teste em modelos animais, incluindo
primatas).
Questionado se os últimos
acontecimentos o farão “abandonar” França, o jovem é peremtório. “Poderei
abandonar a França por outros motivos, pela razão de já estar aqui há alguns
anos e querer experimentar outros ares e outros climas. Sinceramente, estes
atentados não me farão sequer pensar sair daqui pois a intenção desta onda
terrorista é causar o medo com ataques cobardes a civis inocentes que não se
podem defender. Se isso se traduzisse numa mudança de vida quererá dizer que,
de certa forma, eles estão a conseguir os seus intentos”, concluiu Sandro Alves
ao Jornal da Mealhada.
Reportagem de Mónica Sofia Lopes publicada na edição impressa do quinzenário Jornal da Mealhada, número 959, de 25 de novembro de 2015.
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