“Os bombeiros existem para servir a população. Fazemo-lo há 87
anos”
Nuno Antunes João tem quarenta anos, é bombeiro na corporação
mealhadense há doze e, desde o início de 2012, desempenhou funções de adjunto
de comando, integrando o comando que, em regime de substituição desde 15 de
dezembro de 2012, garantiu a operacionalidade do corpo ativo depois do término
do mandato do comandante António Lousada. Em março deste ano, os elementos da
direção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Mealhada
nomearam-no, por unanimidade, comandante da corporação.
Há quantos anos é bombeiro?
Ingressei na Escola de Aspirantes em março de 2002, portanto sou
bombeiro há doze anos.
Esteve sempre na corporação dos Bombeiros Voluntários da Mealhada
ou passou por outras?
Tornei-me bombeiro voluntário porque fui incentivado por um conjunto
de pessoas da Mealhada. Desde essa altura tenho entendido este serviço de
voluntariado como uma espécie de contrato com a população da Mealhada e da área
de intervenção deste corpo de bombeiros em particular. Nunca pensei, sequer, em
fazê-lo noutro corpo de bombeiros.
A direção da Associação Humanitária apresentou-o como comandante,
depois da aprovação por unanimidade, no passado dia 7 de março. O que sentiu
com este grande voto de confiança?
Antes de mais quero agradecer à direção a confiança que depositou
em mim e espero estar à altura do desafio que me foi proposto. Partilho com os
elementos da direção um conjunto de preocupações, espelhadas na carta de missão
que elaborámos em conjunto, e tudo farei para as conseguirmos cumprir em equipa
e através de uma estreita colaboração.
A primeira sensação que tive quando me foi lançado este desafio
não podia deixar de ser a de uma enorme responsabilidade. A nossa associação
está a fazer agora oitenta e sete anos. Durante este tempo teve apenas seis comandantes.
Suceder a estes homens – Bernardino Felgueiras, Edmundo Machado, Hermenegildo
Oliveira, José Felgueiras, José Cunha ou António Lousada –, que pela qualidade
do seu trabalho deixaram um corpo ativo com bons níveis de operacionalidade e
um grande prestígio e notoriedade, não é uma missão fácil.
Há diferenças entre ser adjunto de comando e tomar totalmente
conta do cargo de uma corporação?
Naturalmente, apesar de eu achar que qualquer elemento de comando
deve estar preparado para assumir esta responsabilidade. A missão do comandante
envolve tarefas que exigem um espírito de entrega muito grande. Há que gerir
mulheres e homens que têm as suas particularidades e das quais temos que
potenciar o melhor de cada um para o objetivo comum. Ao mesmo tempo existe um
conjunto – grande – de formalismos burocráticos que têm de ser cumpridos para
que, administrativamente, esteja tudo em ordem. Fazer a ponte entre a direção e
o Corpo Ativo é outra tarefa importante, uma vez que é necessário que tudo
funcione como um todo, para que cada um cumpra a sua missão, sabendo que uma
parte sem a outra, pura e simplesmente, não funciona em pleno.
Como “encontrou”, na transição, o quartel aos níveis de corpo de
bombeiros e de meios?
Esta associação, por mérito das sucessivas direções, tem uma boa
estabilidade financeira o que permite estar razoavelmente equipada a nível das
viaturas. As necessidades neste campo estão identificadas e estamos a trabalhar
para as colmatar. Relativamente ao equipamento de proteção individual, tem existido
pela parte de quem gere a Associação uma preocupação muito grande a fornecer
aos bombeiros o material necessário. É importante referir que na nossa atividade
nunca teremos todos os meios necessários à nossa disposição nem a proteção será
a suficiente, mas o que temos permite-nos cumprir as nossas responsabilidades
com segurança e operacionalidade.
Eu já integrava o comando desde fevereiro de 2012, pelo que não
houve nenhuma surpresa na transição para comandante do corpo ativo.
Que balanço faz destes primeiros meses como comandante?
Faço uma avaliação muita positiva. Tenho sentido o apoio e a
mobilização dos bombeiros nas transformações que eu acho que são necessárias.
Os próprios bombeiros têm participado ativamente nessas mudanças, a sua opinião
e também o seu trabalho têm sido fundamentais para evoluirmos. Acredito que só
podemos mudar algo se estivermos todos empenhados de uma forma positiva e,
neste momento, é a minha convicção que estamos todos empenhados em melhorar
procedimentos de forma a aumentarmos ainda mais a nossa operacionalidade. O
espírito de equipa é uma ferramenta indispensável que contribui para envolver
todos os bombeiros – os do quadro ativo, mas também os dos quadros de Honra e
de Reserva – neste projeto. É necessário ter presente que existe sempre margem
para evoluirmos.
Estamos em pleno verão, estão assegurados os meios e recursos
humanos necessários para os incêndios que, nesta altura, são o que normalmente
mais preocupa?
Em termos de dispositivo, dispomos dos mesmos meios do ano
passado, e note-se que há um ano conseguimos atingir níveis de operacionalidade
fantásticos, graças ao esforço e empenho dos nossos bombeiros. É importante que
as pessoas compreendam que nenhuma corporação de bombeiros no país terá os
meios suficientes para o combate a um grande incêndio na sua área. Os bombeiros
estão equipados para o essencial, sempre que há uma ocorrência de maiores
proporções é fundamental que os corpos de bombeiros vizinhos sejam acionados.
Por isso é que existe uma coordenação distrital e nacional que respeita, por
exemplo, o princípio da triangulação, que funciona para prevenir a falta de
meios, na primeira intervenção, dos corpos de bombeiros. Este princípio tem de
ser universal e colocado em prática nos incêndios florestais e noutras
ocorrências, como por exemplo no dia 15 de julho, com o acidente com matérias
perigosas na Autoestrada 1.
Relativamente aos recursos humanos, na nossa corporação, temos
poucos bombeiros desempregados e por isso temos que contar com a boa vontade
das entidades empregadoras, apesar de, no ano passado, ter acontecido uma
situação lamentável com um bombeiro nosso que foi alvo de um processo
disciplinar por ter faltado ao trabalho, porque estava no incêndio do Caramulo.
Estaremos sempre prontos para o socorro seja ele qual for.
A renovação do corpo de bombeiros está assegurada?
Essa deve ser a preocupação de qualquer comandante que gere um
corpo de bombeiros com quase nove décadas e de uma direção que o gere com vista
ao futuro. Nesse sentido, abrimos uma escola de estagiários no ano passado, e
temos seis candidatos a bombeiros, em estágio probatório que, no final do ano,
se tudo correr bem, serão investidos bombeiros. No próximo mês de outubro
abriremos nova escola, com o mesmo objetivo, o de garantir a renovação dos
bombeiros, procurando chegar a cada vez mais pessoas que se queiram dedicar a
este tipo de voluntariado.
Preocupamo-nos, também, em chegar aos jovens e às crianças – e
isso também é uma estratégia de renovação – e nesse sentido teremos a
iniciativa “Quartel Aberto”, no dia 25 de julho, inserida nas comemorações do
87.º aniversário.
Por outro lado, acreditamos que a renovação do corpo de bombeiros
passa, também, pela reciclagem de conhecimentos de muitos dos nossos
operacionais. A renovação não pode ser, apenas, no sentido de termos cada vez
mais novos bombeiros e bombeiros novos, mas de termos os nosso operacionais com
os conhecimentos e as técnicas mais atualizadas. Felizmente, e depois de uma
longa temporada de espera, conseguimos que a Escola Nacional de Bombeiros
promovesse um conjunto de formações que em muito beneficiaram a atualização de
conhecimentos. Posso garantir que hoje temos um corpo de bombeiros bem formado,
com conhecimentos básicos e atuais nas áreas mais fundamentais.
O que vai ser o quartel aberto a 25 de julho?
Na prática, convidámos as IPSS (Instituições Particulares de
Solidariedade Social) do concelho da Mealhada a visitar o interior do nosso
quartel, a vir conhecer os nossos espaços museológicos, a observar as dinâmicas
e o funcionamento de um corpo de bombeiros voluntários em serviço. Nesse dia,
na véspera do nosso aniversário, teremos, ainda atividades lúdico-pedagógicas
para as crianças e para os jovens no sentido de as sensibilizar para o
voluntariado nos bombeiros, para a problemática da proteção civil de pessoas e
bens, de modo a incutir os valores associados ao imaginário dos bombeiros.
Temos já a confirmação da participação de algumas IPSS, o que muito nos alegra.
Que palavra quer deixar à sua corporação, aos sócios e aos
elementos dos órgãos sociais?
Acima de tudo, gostaria de aproveitar a oportunidade para deixar
uma palavra à população do concelho da Mealhada e especialmente à área de
intervenção do nosso corpo de bombeiros: Quero mostrar a minha disponibilidade
para o serviço e, acima de tudo, deixar palavras de confiança e de serenidade.
Os bombeiros existem para servir a população, na proteção de pessoas e bens,
emergência pré-hospitalar e na prestação de cuidados de transporte de doentes.
Fazemo-lo há oitenta e sete anos e continuaremos a fazê-lo.
Os bombeiros sabem que contam comigo e procurarei sempre o melhor
para eles, criando condições para que a sua missão seja desempenhada de uma
forma segura e eficaz. Trabalharei sempre pelo exemplo. Os membros dos órgãos
sociais também sabem que o corpo de bombeiros está com eles e que espera que a
sua vitalidade, dinamismo e juventude possam engrandecer a instituição e a sua
ação diária.
Acredito, sinceramente que sozinhos seremos o que pudermos, juntos
seremos o que quisermos!
Entrevista de Mónica Sofia Lopes publicada na edição impressa do quinzenário Jornal da Mealhada, número 924, de 23 de julho de 2014.
Fotografia de Inês Rama.
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