As contas ainda não estão concluídas,
nem são oficiais, mas Fernando Saldanha, presidente da direção da Associação de
Carnaval da Bairrada (ACB), estima que, em 2014, o Carnaval Luso Brasileiro da
Bairrada tenha dado um prejuízo no valor de “quarenta mil euros”. O
cancelamento do desfile no Domingo Gordo, o mau tempo no de terça-feira, em que
esteve constantemente a chover, e a diminuição do preço do bilhete no corso do
dia 9 de março, já fora de época, estão na base deste prejuízo, segundo o
dirigente.
Apesar da chuva, no desfile de
terça-feira, dia 4 de março, estiveram no Sambódromo Luís Marques, na cidade da
Mealhada, duas mil e quinhentas pessoas (o preço de cada bilhete era cinco euros).
Já uma semana depois, fora de época, no domingo, dia 9, com o tempo sereno e o
preço do bilhete a três euros, a organização “esperava mais do que três mil e
quinhentas entradas”.
Até ao momento de dados
financeiros oficiais, o Jornal da Mealhada sabe que Saldanha previa um orçamento
de cento e vinte mil euros para o evento, informação dada na conferência de
imprensa realizada a 31 de janeiro, que a Câmara Municipal da Mealhada
comparticipou com oitenta e quatro mil euros e que, para já, há a forte probabilidade
de o evento ter dado um prejuízo, que ronda os quarenta mil euros.
Acerca das falhas que contribuem
para o evento, Saldanha remete para “o mau tempo” e Rui Marqueiro, presidente
da Câmara da Mealhada, a maior patrocinadora do Carnaval Luso Brasileiro da
Bairrada, não quis comentar e deixa no ar que “o evento tem que ser, no futuro,
repensado”.
Para João Peres, presidente da
mesa da assembleia-geral da ACB, “o atual modelo de gestão do Carnaval está
ultrapassado e tem mesmo que ser reestruturado”. “Isto é mais do mesmo.
Trata-se do evento mais reconhecido da Mealhada, mas também o que consome mais
dinheiros públicos da Câmara Municipal e há que ter cuidado na clareza do seu retorno.
O modelo está esgotado e a autarquia deve ter uma palavra a dizer no
investimento e gestão do Carnaval, uma vez que é o seu maior patrocinador”,
declara João Peres, garantindo: “O Carnaval deve associar-se a outros eventos
com aproveitamento de recursos”. “Justifica-se haver uma ACB, quando as escolas
de samba também estão transformadas em associações e desenvolvem as suas
atividades anualmente?”, pergunta retoricamente.
“Real Imperatriz é uma escola
muito incerta”
O presidente da assembleia-geral
da ACB não deixa, contudo, de elogiar o evento de 2014. “Gostei muito das
escolas de samba”, elogia João Peres, que enfatiza a situação do Grupo
Recreativo Escola de Samba Real Imperatriz, de Casal Comba, que, por não ter
cumprido os requisitos “impostos” pela ACB, apenas pôde desfilar como grupo de
animação, intitulado de Turma do Rambuque. “Congratulo-me com o comportamento e
dignidade com que a Real Imperatriz se apresentou no desfile. Veio demonstrar
que tem muito a dar a este Carnaval e ao seu concelho, considerando todas as
adversidades porque passou”. Mas para Saldanha “as regras são para se cumprir”.
“Não cumpriu com absolutamente nada do que pedimos. Nem com as datas de
projetos dos carros e nem dos fatos, logo apenas os aceitámos como grupo de
animação”, continua Saldanha, que ainda acrescenta: “Porque é que todas as
escolas de samba cumprem e aquela não? Para além disso, um ano apetece-lhes ir
e outro já não. É uma escola muito incerta”.
Já sobre as restantes três
escolas de samba (Amigos da Tijuca, Batuque e Sócios da Mangueira, João Peres
tece muitos elogios. “Proporcionaram um grande espetáculo. As pessoas que se
deslocaram à Mealhada certamente saíram satisfeitas. Devemos apoiá-las e
acarinhá-las ainda mais, pois têm bastante potencial”, afirma João Peres,
sugerindo que, no futuro, “se deve procurar que o corso seja composto por
grupos de associações e entidades concelhias tentando evitar que venham de
outros lados”.
“ACB é demasiadamente subsídio
dependente”
Acerca do Carnaval da Mealhada
ter “visto”, em 2014, dois concursos - um da ACB, pela primeira vez (que poucos
tiveram conhecimento porque a informação nem na conferência de imprensa foi
transmitida), e a oitava edição do do Jornal da Mealhada -, João Peres garante:
“A ACB deve fazer coisas novas e não tentar desfazer as que já estão feitas.
Entendo que o concurso é uma mais valia para o Carnaval, mas deve ser feita por
entidades independentes que possam sim contar com o apoio dos promotores do
Carnaval. A ACB é demasiadamente subsídio dependente e eu não lhe reconheço
autonomia, capacidade e nem humildade suficientes, para pôr em causa uma
instituição concelhia, de reconhecido mérito, como a Santa Casa da Misericórdia
da Mealhada (SCMM)”, proprietária do Jornal da Mealhada”. “Felicito-o por ter
organizado mais uma edição do seu concurso, agradeço aos jurados pelo seu
empenhamento, dedicação e competência e dou os parabéns ao Batuque por se ter
sagrado bicampeão”, acrescenta.
E vai mais longe. “É inadmissível
que a SCMM, para prestar mais este serviço à sociedade e à ‘terra’, tenha sido ‘obrigada’
a adquirir trinta bilhetes, a cinco euros cada (quando as entradas foram a três
no corso do dia 9), tendo em conta que, desde sempre, tem colaborado
voluntariamente e gratuitamente em tudo o que lhe é solicitado para com o
Carnaval, nomeadamente, com a cedência da Unidade Móvel de Saúde e o seu
pessoal, e prevenção e reforço nas Urgências do Hospital da Misericórdia da
Mealhada, sempre que o evento se realiza”, lamenta o antigo presidente da
direção e fundador da ACB.
Outra das preocupações de João
Peres passa pelo facto de, no próximo mês de maio, a ACB ir a votos. “Em maio
há eleições e preocupa-me bastante a continuidade do Carnaval e da ACB, face
aos prejuízos previstos. Duvido que mais uma vez apareça alguém para assumir o seu
comendo e reconheço que é uma grande responsabilidade arrancar com quarenta mil
euros de saldo negativo e sem soluções para a recuperação”.
O presidente da assembleia-geral
admite que a realidade mais próxima seja “a solicitação ao senhor Saldanha e
sua equipa para que continuem à frente da ACB”. “A viabilidade financeira e de
recuperação do saldo negativo é quase impossível mantendo o mesmo nível de
qualidade do corso. Mesmo com chuva, algo está mal explicado”, garante João
Peres, que apela a que se façam contas.
Reportagem de Mónica Sofia Lopes publicada na edição impressa do quinzenário Jornal da Mealhada, número 915, de 19 de março de 2014.
Fotografia de Rodrigo Mortágua
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